[rascunho] A Ética deveria evitar as causas dos conflitos?



Os posts marcados como [rascunho] reúnem pensamentos meus que ainda não foram testados e podem, assim, estar certos ou grosseiramente errados. O objetivo de postá-los é estimular o pensamento e o confronto com novas ideias.


Conflitos se dão quando há duas ou mais reivindicações mutuamente excludentes.

Solucionar um conflito, do ponto de vista da Ética, significa declarar, dentre as vontades mutuamente excludentes, qual é a correta de prevalecer. Essa é a Premissa da Solução.

Uma norma que, se seguida, impeça o surgimento de conflitos é superior a uma que soluciona os conflitos mas continue os suscitando mesmo se for seguida. Essa é a Premissa da Evitação.

Premissa da Evitação pode parecer uma novidade, mas já está presente no raciocínio libertário:

Há VÁRIAS normas que solucionam conflitos conforme apenas a Premissa da Solução: a regra de que o "primeiro usuário" seja o dono, por exemplo, permite declarar uma única vontade a prevalecer tanto quanto a regra de que seja, digamos, o "segundo usuário" ou ainda que deve prevalecer a vontade do "solicitante atual" do uso;

Uma premissa auxiliar levantada para a solução de conflitos envolve a mitigação de sua ocorrência futura. A norma citada do "usuário atual" seria inferior pois suscitaria conflitos adicionais constantemente: dois indivíduos A e B poderiam impedir infinitamente o uso de um bem entre si tornando-se, alternadamente, o "solicitante atual" assim que o outro assumisse a propriedade por ter sido o solicitante atual no momento anterior. A norma do "segundo usuário" (ou de qualquer enésimo usuário) enfrentaria problema similar, ficando na prática o uso suspenso até se alcançar a enésima ocorrência do conflito. A norma do primeiro usuário, por outro lado, já alcança a solução definitiva do conflito desde a primeira ocorrência e evita contendas futuras se for seguida.


Porém, as reivindicações mutuamente excludentes que estão presentes num conflito, enquanto Ações (praxeologia), são produzidas a partir de estados de menor satisfação;


Tendo isso em vista, uma ética que resolva conflitos apenas declarando a prevalência da reivindicação do primeiro usuário de um bem não é tão eficiente para a evitação de conflitos quanto uma que leve em conta também a ocorrência de estados de menor satisfação geradas com o uso destes bens, vedando-os. Uma ética que vede tais usos implementa a Premissa da Evitação, pois previne a causação dos estados de menor satisfação que geram as reivindicações mutuamente excludentes, conflituosas.

A ponderação do elemento da satisfação volta a incluir o aspecto consequencial e pragmático na Ética, sem que no entanto ela incorra nos problemas tipicamente levantados contra o utilitarismo, enquanto a mantém embasada em termos lógicos e praxeológicos.

O argumento deste post pode ser exposto da seguinte forma:
1- Conflitos ocorrem quando há reivindicações mutuamente excludentes;
O que causa conflitos é a existência de duas vontades mutuamente excludentes sobre algo, ou seja, quando dois ou mais indivíduos agentes esperam obter maior satisfação de forma mutuamente excludente entre si (i.e., se um fica mais satisfeito, outro fica menos e vice-versa).

2- Reivindicações se dão por meio de ações, e o axioma da ação já nos ensina que toda ação é motivada por um desconforto, um estado de menor satisfação;

3- O que vai eliminar conflitos, portanto, não é a mera atribuição de direitos de propriedade, mas sim regras que proporcionem a convivência com a menor ocorrência de estados de menor satisfação, que é o que motiva os conflitos;

OBJEÇÕES
Uma objeção imediata à conclusão é que a vedação de certos usos causaria estados de menor satisfação naquele que teve seu uso frustrado. Embora isto seja verdadeiro, esta insatisfação ou discordância em relação a uma norma ética em si não se trata de um conflito entre partes como aqueles que são objeto da ética, (Por exemplo, a insatisfação ou discordância de um ladrão frente à norma ética de não roubar não configura conflito adicional).

Outra objeção é que a Premissa da Evitação seria impossível de cumprir na prática, pois seria requerido, antes de qualquer uso, uma investigação de se ele causaria menor satisfação em qualquer outro indivíduo do mundo. Mas esta barreira só parece intransponível supondo as limitações atuais de nossa tecnologia comunicativa. É perfeitamente factível uma tecnologia futura que, permitindo a comunicação diretamente entre as mentes, tornasse essa consulta algo trivial e praticamente instantâneo. Não é válido balizar conclusões de uma Ética a priori com base em limitações contingentes da tecnologia presente. Outro ponto é que os usos de algum bem, em geral, não têm sequer potencial de afetar todos os indivíduos: ninguém deseja todos os fins a ponto de o uso de todos os meios o impactar.  A conclusão mais correta de acordo com esta objeção não é de que a Ética não deve levar em conta o impacto na satisfação alheia, mas sim uma discussão sobre como proceder nos casos em que seria impossível, circunstancialmente, a consulta àqueles afetáveis pelo uso.